sábado, 31 de dezembro de 2016

2016 - Melhor ou Pior Ano?

Mais um ano passa, mais um ano de vida, mais um ano de experiência, mais um "nível" que se evolui neste Jogo. Tem sido referido como um dos piores anos de que temos experiência, as situações globais continuam a agravar-se como se sabe, muitas guerras, muitas mortes, um líder global com cabelo de nylon e inúmeras figuras públicas que nos deixaram.

No entanto, em momentos de reflexão como estes, há sempre a questão que me fica: que fizemos nós, cada uma das pessoas, realmente para contrariar estes problemas? Já há muito que me conformei com a minha impotência na escala global em que vivemos. O meu mundo rege-se pela corrida e o estudo, são o meu dia a dia e nada mais me preocupa.

Faz hoje um ano foi a primeira vez que escrevi uma reflexão sobre os 364 dias que se tinham passado desde a última vez que a Terra esteve no mesmo local do Cosmos. 2015 foi um ano de muitas mudanças, em que muito se passou, mas que, no final, defini claramente aquilo que ambiciono: corrida.

Após interrupção por um período de um ano e meio, decidi retomar o plano de corridas do projeto Run4Excellence. No entanto, não correu da maneira como esperava. Pela altura do Natal, num treino do Centro de Marcha e Corrida do Porto, levei-me ao limite e acabei por ultrapassá-lo, tendo contraído uma lesão na Banda Iliotibial (ou Fáscia Lata). Sim, para o "comum dos mortais" isto não significa nada. Trata-se de uma banda grossa de tecido que se extende desde a anca, pela parte exterior da coxa, inserindo-se na Tíbia. Esta lesão impediu-me de recomeçar os treinos como teria gostado no início de Janeiro, muitas vezes provocando dores a andar, quanto mais seria a correr.

Enquanto fui melhorando, decidi escrever sobre o meu mês de Janeiro e Fevereiro. Tinha sido um pequeno objetivo a que me tinha proposto para 2016, mas que não cumpri como gostaria. Recordo-me de relatar que, na altura, enquanto estava a recuperar, treinei um total de 4 corridas em Janeiro e 12 em Fevereiro. No entanto, o que mais ajudou a recuperação foi a grande motivação para rapidamente retomar a corrida, que me permitiu realizar, em casa, bastastes treinos de força e reforço muscular dos membros inferiores.

Chegado ao fim do mês de Fevereiro, sentia que estava em condições de reiniciar os treinos. O objetivo, para já, era bastante claro: Lisbon Eco Marathon Meia Maratona Corredor Verde. A 4 meses de distância, a começar praticamente do Zero, tinha muito que trabalhar, mas a começar devagar.

A falta de treino que se observou desde que vim viver para o Estoril, em Setembro de 2015, juntamente com o frio dos meses de Inverno, provocou-me algo que nunca tinha sentido antes: a garganta a "fechar-se" e a impedir-me de respirar corretamente. A solução que arranjei foi correr com uma gola, usada para aquecer a garganta, mas a cobrir as vias respiratórias, auxiliando o aquecimento do ar que entra para os pulmões. Esta solução fui usando desde que fui tentando correr em Janeiro e Fevereiro e até ao fim de Março.

Durante este primeiro mês em que retomei a corrida, apesar de não planeado e, claramente, não recomendado, participei na Corrida do Dia do Pai no Porto. Com muita calma, com apenas 3 horas de sono e com treino de força do dia anterior, concluí a distância em 39 minutos. Esta prova acabou por ser uma vitória para mim, pois com apenas duas semanas de treino, demonstrei, especialmente a mim mesmo, que tinha capacidade de correr e que o "bichinho" ainda aqui estava.


Passada esta experiência, sabia que não podia andar a fazer isto, poderia correr mal, tendo um objetivo tão claro definido. Todo o mês de Abril foi dedicado ao treino e à evolução na corrida, preparar-me fisicamente, para começar em Maio com uma prova de trail. A Taça Ibérica de Trail, realizada em Caminha, uma das provas de trail de maior dificuldade do país, segundo me informaram, claramente a mais desafiante em que já participei. Wings for Life. Correr por aqueles que não podem, numa prova de dimensões globais e em grande diversão. Foram apenas 10km muito divertidos, uma vez que o dorsal foi oferecido.

Apesar de estar ainda em fase de evolução, correu-me melhor do que esperava conseguir, tendo terminado em 47º lugar. No dia seguinte, claramente sem esforçar, fui fazer a

Em Junho finalmente chegou a prova para que tanto tinha treinado: Lisbon Eco Marathon. Sou totalista desta prova, já fiquei duas vezes em 2º lugar. Ao contrário do ano passado, desta vez andei a treinar a sério e estava preparado. O atleta que ganhou o ano passado também lá estava, mas desta vez não me ia deixar ficar tão facilmente. No entanto, de um ano para o outro, apareceram mais atletas, com níveis de performance melhores que antes tinha testemunhado nesta prova. Corri o meu melhor, superei o atleta que ganhou o ano passado melhorado em 5 minutos o tempo que ele tinha feito. Ainda assim, apenas me permitiu um 3º lugar.
Na altura não escrevi sobre a minha experiência. Por um lado, estava claramente contente por ter conseguido, uma vez mais, um lugar de pódio, mas por outro um pouco chateado com o não ter conseguido ainda o lugar mais alto. O tempo passou e acabei por não relatar a minha experiência (ver registo).

No início do Verão comecei a fazer campos de férias em Cascais. Adorei a experiência, o trabalhar com crianças todos os dias, conhecer e interagir diariamente com pessoas novas, monitores com quem se partilha tanto que amizades fortes surgem no espaço de apenas dias. Treinar durante os Campos revelou-se outro obstáculo: um dia inteiro, a começar às 8h e terminar pelas 18h cansa mais que pensava ser possível. Chegado ao fim do dia, de maneira nenhuma vou conseguir ir treinar, o corpo não aguenta mais. Para resolver este problema comecei a ir correr antes de ir para os Campos. 5h30 toca o despertador, bebo um copo de água enquanto realizo alguns exercícios de aquecimento, para não ir correr com o ácido no estômago a chatear, e saio para treinar com o Sol a aparecer por detrás dos edifícios.

Esta solução permitiu-me ir treinando durante o Verão. No final de Julho, um pouco à semelhança da situação da Eco Marathon, corri uma prova no dia 31 de Julho que também não relatei. Corri o Trail de Santa Justa, 30km pela Serra de Valongo, foi a primeira vez que corri esta distância na montanha. A prova fazia parte do calendário objetivo da minha equipa, pelo que decidi fazer, a ver como seria, bem como dar o meu melhor para a vitória de equipas, que ambicionávamos. Com clara falta de experiência em distâncias grandes, comecei um pouco mais rápido do que deveria, tendo começado a ficar cansado logo desde o quilómetro 12, com ainda mais de metade da distância pela frente. A companhia de dois colegas de equipa preveniu a minha desistência, tendo corrido com eles mais de 30min. A partir do último abastecimento, cerca dos 23km, senti o gel que tinha tomado a fazer efeito, senti-me com mais energia e comecei a correr muito melhor. Consegui deixar os meus colegas para trás e estava a correr como nunca! Durante os 7km que restavam até à meta estive constantemente a passar atletas, a maior parte da distância curta, mas ainda uns 4 da mesma distância que eu. As subidas, que nunca foram o meu forte, fazia-as todas a correr, nada me parava. Cheguei ao fim no 17º lugar, tendo sido 1º lugar Sub23. Conseguimos, em equipa, ganhar na distância de 30km e de 15km.
Na altura não relatei a minha experiência por não saber bem como passar aquilo que sentia por ter feito, pela primeira vez, 30km e ter corrido tão bem e, associado a isso, tive uma semana de férias no Algarve logo a partir do dia seguinte (ver registo).

Férias no Algarve diferente do que normalmente seria de pensar. Penso que nunca serei capaz de pegar em 300 ou 400€ e gastar numa semana de beber e sair à noite todos os dias. As férias foram com a minha mãe, numa casa emprestada pela semana. Enquanto lá estive também acabei por ir sair com amigos, mas não no mesmo regime que as pessoas que vão apenas com amigos. Além dessa questão, durante 3 dias tinha muitas dificuldades em andar. O esforço final da corrida, o "boost" de energia que o gel me deu permitiu-me correr imenso no final da prova, mas praticamente "destruiu" os músculos. Cada passo era doloroso, descer escadas era um tormento e andar na praia uma angústia. Foi uma semana de descanso, em que apenas corri no dia de ir embora, apenas 40min.


Acabei Agosto com o Caminho de Santiago. Foi a segunda vez que fiz, o ano passado gostei tanto que quis repetir. Desta vez houve duas coisas diferentes: não fiz com a companhia do meu pai e reduzi o tempo da viagem em metade. O ano passado, o meu pai começou comigo, mas devido a bolhas nos pés foi forçado a desistir no 5º dia, mas continuei com amigos que tinha conhecido no Caminho. Isso é o que de mais espetacular tem esta experiência, as relações que se cria com tanta gente que também se encontra a fazer o Caminho. Não sou uma pessoa religiosa, faço-o, fiz, por motivações físicas, um desafio a que me propus e que quis superar, mas a experiência revelou-se muito mais que apenas física, foi espiritual, da maneira mais profunda do meu ser.

Este ano foi diferente em todos esses aspetos, com exceção de um: desafio físico. Embora o ano passado tenha absolutamente adorado a experiência, o conhecer e interagir com novas pessoas, que acabei por acompanhar até ao fim, do ponto de vista físico fiquei com a sensação que poderia fazer mais e melhor. Em vez dos 10 dias, decidi fazer em 5. Juntar cada 2 etapas das que tinha feito o ano passado, passar num albergue e continuar caminho até ao seguinte. Passar por uma cidade e não parar até chegar à seguinte. Fazer cerca de 50km a caminhar, por dia. Isto teve um problema: solidão. Era mais rápido que toda a gente, pois queria cumprir a distância ainda enquanto fosse dia, e fazia mais que toda a gente. Isso implicava passar por pessoas, cumprimentar e seguir caminho.

Posso dizer que, após bastante sofrimento, uma vez mais consegui superar o desafio a que me propus. Desta vez posso dizer que custou bastante, os pés começaram a criar bolhas, que eu nem sabia o que seria isso, os braços a ficar cansados e a mente a vaguear. Recordo-me, no meu 4º dia, a chegar à cidade de Caldas de Reis, em retas de estrada de terra, entrava num estado de transe. Não via o que estava a minha frente, apenas andava, enquanto a mente estava "apagada". Dei por mim a entrar na cidade sem me recordar dos últimos 10km. Apesar de tudo, foi uma grande experiência, que espero continuar a repetir de ano para ano.

À semelhança do ano passado, fui registando a minha experiência em cada dia:

Durante o Caminho estreei o meu novo relógio de corrida, o Garmin Forerunner 735XT. Sou um pouco obececado pelo controlo, quero saber tudo. O novo relógio que comprei permite-me ler os passos diários, registar a frequência cardíaca no pulso, analisar o sono e mostrar as notificações do telemóvel. Em corrida indica também a frequência da passada. Com a banda cardíaca, para além de uma leitura mais precisa da frequência cardíaca, é também capaz de analisar o tempo de contacto com o solo, a distribuição do tempo de contacto entre o pé esquerdo e direito, a oscilação vertical e, com as medidas mais precisas da frequência cardíaca, indicar uma estimativa de VO2Max e prever tempos para determinada distância a correr.

Com uma bateria de melhor capacidade, permitia-me registar cada dia do caminho, a nível de GPS e frequência cardíaca (não usei a banda durante o Caminho). Um pouco por brincadeira, registei-me num desafio do GarminConnect, que faz uma pequena rivalidade para ver quem faz mais passos numa semana, entre as pessoas que se inscrevem no desafio. Portanto, fiquei a saber que, os cerca de 250km que separam Porto e Santiago a pé realizei com 313 mil passos.

Após o Caminho ficaram algumas mazelas, especialmente no Tendão Tibial Anterior (tendão que "puxa" o pé para cima). Quando voltei a correr ainda fui sentindo algumas dores, durante a semana seguinte. Estava já em Setembro e queria fazer uma Meia Maratona no início de Outubro. Só na semana anterior decidi entre Lisboa e Ovar, sendo que fiquei por Lisboa, por motivos de agenda. Não foi a minha melhor experiência de organização da prova, que pode ser lido aqui. Tanto quanto me for possível, evitarei no futuro provas organizadas pelo Maratona Clube de Portugal.

Outubro foi o mês deste ano que considero que estive em melhor forma. Apesar da má organização da Meia Maratona Rock and Roll, quando estava a correr consegui correr a ritmos de 3'37''/km durante 19km. Ainda neste regime de forma física corri a Corrida Montepio, uma prova que também sou totalista e que considero como sendo a minha prova de eleição de 10km do ano. Apesar de não ter corrido bem de maneira nenhuma, consegui manter a marca abaixo dos 35min.

Nesta prova acabei por contrair uma lesão no tornozelo, no Tendão Tibial Posterior, responsável pela estabilização do tornozelo, no momento da pronação. O treino ficou um pouco limitado depois disso, tendo reduzido bastante a carga semanal, mesmo com uma prova de trail no dia 20 de Novembro. Fiz o Trail Amigos da Montanha com algum receio que pudesse piorar a minha lesão, mas com algum cuidado consegui ter uma boa prestação e não prejudicar o tendão já debilitado.

Desde essa prova que optei por não realizar mais nenhuma até ao final do ano, estando apenas focado em recuperar e evoluir, para entrar em Janeiro mais forte que nunca e ter boas prestações em 2017. Até porque, associado à lesão, o final de semestre é sempre a pior altura, tendo ficado duas semanas seguidas a sobreviver a RedBull (sim, eu sei que faz terrivelmente mal), não tendo treinado na última antes de acabarem as aulas. Durante estas férias de Natal aproveitei bem para descansar e retomar os treinos, cada vez com mais motivação.

Olhando para trás, os últimos 365 dias talvez não tenham sido os melhores que poderiam ter sido, a nível pessoal e do ponto de vista global. Apenas ambiciono por continuar a melhorar e continuar os estudos da melhor maneira. A minha maior falha talvez tenha sido, depois de proposto, não relatar as minhas experiências a cada mês. Quando retomei o treino em Março pensei no que poderia escrever, queria deixar a minha evolução falar por si mesma, pelo que acabei por não mais fazer o que comecei em Janeiro e Fevereiro.

Optei, desta vez, por não refletir sobre questões para além da corrida. Os motivos são diversos, possivelmente o principal ser a falta de motivação de mexer nessas rochas, agora que se encontram arrumadas nos seus cantos.

Entro em 2017 com um claro objetivo no curto prazo, mas ainda sem grande objetivos no longo prazo. Decidi que, tal como aconteceu em 2016, não irei realizar muitas provas. Quero evoluir e fazer provas não permite isso.

Este ano que passou, a nível de corridas, apenas foi possível pela grande paciência da minha treinadora Sofia, pelo acompanhamento que me deu a cada semana. A clara evolução deve-se sobretudo a ela e ao projeto Run4Excellence.

Tenho de agradecer profundamente a todas as pessoas que, um ano mais, me aturaram e me ajudaram. Não enumerarei, com receio de falhar alguém, mas claramente quem é saberá tudo o que fez por mim.

Em 2016, para um total de 151 atividades de corrida, percorri uma distância de 1746km em cerca de 129 horas. A velocidade média foi cerca de 13,5km/h, ritmo de 4'27''/km, queimando uma estimativa de 125 mil kcal.
No total, incluindo a aventura de bicicleta até Caminha, entre outras voltas de bicicleta, e o Caminho de Santiago, realizei 193 atividades, cumprindo 2260km em 224 horas, uma velocidade média de 10,1km/h,requerendo para isso 155 mil kcal.


Um Bom Ano de boas corridas para todos!

 Novas aventuras nos aguardam no próximo ano.



quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Trail Amigos da Montanha 2016

7 da manhã, toca o telemóvel: "Carlos Daniel GT". Merda, adormeci! Tinha definido o despertador para as 6h, estava combinado encontrar-me com os meus colegas às 6h45. Vestir a correr, engolir um bocadinho de massa aquecido pela minha mãe e saio a correr pelas escadas abaixo.

Chegados a Barcelos ainda cedo, recebidos pela chuva e frio, vamos a um café comer e tratar de "aliviar" um pouco mais de peso para a corrida. Um cafezinho e um pastel de carne acabado de fazer e começa a ficar na hora da partida da prova dos 30km. A chuva não dá tréguas e à8h30 dá-se a partida da prova, com vários elementos da minha equipa a participar, eu e mais uns estávamos do lado de fora a vê-los partir. 

Daí ainda faltava 1h30 para a minha partida. Podíamos agora levantar os nossos dorsais para os 18km e depois voltamos para o café, aproveitar o abrigo da chuva e o quentinho confortável. Começando a chegar a hora da prova vou ao carro vestir-me e como uma barrita para me dar energia para a prova e alguma cafeína para despertar.

Inicialmente tinha previsto correr com uma camisola térmica, um colete de inverno e a camisola de equipa por cima. Com o frio e a falta de treino das últimas semanas devido a lesão, usei gola durante a corrida e especialmente para aquecer a garganta durante a corrida de aquecimento e esta não fechar e dificultar a respiração. Uma corridinha de 10min para aquecer e a chuva a diminuir, decidi tirar o colete, apenas iria correr com a tshirt térmica e a camisola de equipa por cima.

Encaminho-me para a partida e alinho-me na frente com os meus colegas de equipa. A partida foi rápida, deixei-me levar pelo Bruno, que foi o melhor Gaia Trail nos 18km, e fiz o primeiro quilómetro em 3'30'', tendo em conta que as sapatilhas de trail são bastante mais lentas. 

Nesta prova decidi usar pela primeira vez as Merrel All Out Peak. Recebi-as há um ano, como prémio (atrasado) do 2º lugar na Meia Maratona Lisbon Eco Marathon. Nunca as tinha usado para correr, apenas para caminhadas e uso diário, mas devido à grande intensidade de chuva e sabendo da quantidade de lama que haveria, eram a minha única hipótese.

Os quilómetros seguintes continuaram a ser rápidos, entramos em zona de mato mas que permitia correr a bom ritmo. Começou a surgir alguma lama e umas pequenas subidas. Como sou atleta de estrada, as subidas não são muito o meu forte, desgastam-me muito e impedem-me de depois conseguir correr devido ao cansaço. Tinha visto no mapa de altimetria disponibilizado que haveria duas principais subidas: uma cerca dos 6km e outra depois dos 8. 

No início ainda tentei esforçar-me para correr, mas depressa apercebi-me que não seria possível fazer as subidas sem parar. Corria o melhor que podia nas zonas planas e descidas e nas subidas fazia sempre a andar, sendo que quando o terreno ficasse um pouco mais plano começaria logo a correr. Com isto em mente, entre o 6º e o 9º quilómetro o ritmo foi bastante reduzido, tendo atingido o meu ritmo mais lento de 9'30''.

Passadas essas duas subidas comecei a correr mais rápido, a conseguir fazer ritmos de cerca de 4'/km. O tornozelo, lesionado depois da Corrida Montepio, mostrava sinais de vida, mas não impedia a corrida, pelo que me senti bem e dei o meu máximo. 

Passado o meio da prova tentei tomar o outro gel que tinha, um "Liquid Gel" que tinha sido dado a todos os membros da equipa. Tento rasgar a parte de cima com os dentes e aperto com toda a força que tenho para sair alguma coisa, o orifício que permitia a saída do gel era demasiado pequena. Ainda andei assim durante quase um quilómetro, até que começou a descer com algumas árvores pelo caminho. Com a necessidade de usar as mãos para me agarrar as árvores, coloquei o que restava do gel num dos suportes da mochila e nunca mais me lembrei dele.

Nas subidas os atletas apanham-me e passam por mim, não consigo mais que ir a caminhar. O ritmo cardíaco reduz um pouco, chega a zona plana e começo a correr. Volta a passar por eles e dou tudo o que tenho até a subida seguinte, mas o terreno que ganhei é suficiente para que não me consigam apanhar, mesmo estando a caminhar devagar nas subidas.

Quando olho para o relógio e vejo que já tenho 16km dá-me energia para continuar e puxar por mim. Começo a reconhecer algumas zonas de quando me estreei pelo Gaia Trail há dois anos nesta prova, mas a prova desta vez é diferente. Pior parte foi a chegar a uma zona de vinhas, que pelos vistos era também perto de uma ETAR. O cheiro era terrível, pensava que daí até ao fim seria apenas mato, mas uma pequena (muito ligeira) subida com lama matou-me o ritmo é vi-me a passar de 4'/km para 5'30'' durante quase 500 metros.

Finalmente saio de vez da montanha, começa a predominar o asfalto e vejo um atleta ao fundo. Este é o meu terreno, é aqui que posso recuperar algum do tempo e talvez alguma posição das que perdi nas subidas. Lentamente vou-me aproximando do atleta que vi, mas ele olha por cima do ombro e começa também a esforçar-se. De volta a Barcelos passo por um outro atleta dos 30km e entro na rua de lojas perto da meta. Já estou no meu limite e o meu rival deixou-se guardar alguma energia para o final.

Acabo a prova com 1h44, em 13º lugar. Olho para o relógio para descobrir que afinal tinha corrido mais de 19km.

Pela primeira vez numa prova de trail, não fui traído por dores de costas durante as descidas e acabei a sentir-me bem, ao ponto de ir pouco depois mais atrás e ajudar os meus colegas de equipa nos momentos finais da sua prova.

Com a minha prestação e a dos outros elementos Gaia Trail, conseguimos um 2º lugar por equipas na prova de 18km, sendo que nos 30km a equipa consegui o lugar mais alto no pódio.

Uma distância de 19,19km em 1h44min, representando uma média de 5'25''/km.
Voltas:
  • 1ºkm 3'31''
  • 2ºkm 4'04''
  • 3ºkm 4'11''
  • 4ºkm 4'32''
  • 5ºkm 5'34''
  • 6ºkm 6'32''
  • 7ºkm 7'18''
  • 8ºkm 8'40''
  • 9ºkm 9'38''
  • 10ºkm 7'38''
  • 11ºkm 4'17''
  • 12ºkm 6'17''
  • 13ºkm 4'23''
  • 14ºkm 5'00''
  • 15ºkm 4'22''
  • 16ºkm 4'07''
  • 17ºkm 4'42''
  • 18ºkm 4'17''
  • 19ºkm 4'06''
  • 190 metros 45seg (ritmo 3'59'')

Ver registo: Garmin Connect



Outros elementos de equipa para classificação de equipa nos 18km (da esquerda para a direita): Paulo Pinho 41º lugar, Bruno Santiago 7º lugar e Pedro Sousa 21º lugar.

segunda-feira, 31 de outubro de 2016

Corrida Montepio 2016

A minha prova de eleição de 10km, ir e voltar completamente plana. O meu recorde aos 10km foi aqui estabelecido em 2014, 35min. O objetivo era melhorar, eventualmente conseguir chegar aos 33min.

Ainda antes de chegar o dia da prova já tinha começado a correr bem. Apesar de no último ano não ter realizado nenhuma prova de 10km abaixo dos 35min, que me permitisse partir no bloco de partida Elite B, um mail bem argumentado, com algumas da minha capacidade física, consegui ser o suficiente para beneficiar deste bloco de partida.

Chegado o dia da prova, já com o kit de atleta levantado no dia anterior (uma viagem de que fui forçado a fazer propositadamente a Lisboa, na qual perdi mais de 2 horas), encaminhei-me com o meu pai para a Praça do Comércio, para a zona onde iríamos entregar o nosso saco e o guardariam até ao fim da prova. É esta uma pequena grande diferença numa prova bem organizada: a existência de bengaleiro para guardar os pertences.

Na mesma altura em que eu bati o meu recorde de 35min, o meu pai tinha batido o dele, baixando os 50. No entanto, uma vez que tinha sido há mais de um ano, não foi capaz de apresentar comprovativo para partir no bloco de partida sub50, tendo por isso partido no sub60, numa partida 10min depois da primeira. Com isso em mente, e de forma a tentar ter uma partida melhor, foi logo para o local da partida situada no Rossio. Por outro lado, eu sabia que tendo o dorsal para o bloco de partida Elite B não teria de me preocupar com ir tão cedo para a partida, poderia perder mais algum tempo a aquecer com calma e ir para a partida apenas 5 min antes da hora.

Até aqui tudo bem, teria uma boa partida e sentia-me em boa forma, andei a treinar desde Março para estar agora numa boa forma física e melhorar a minha marca. A prova começa e eu tento desde logo manter o ritmo a que me tinha mentalizado: 3’20’’/km. Durante os primeiros 500 metros ainda acompanhei o grupo da frente, mas sem tentar estar a manter aqueles ritmos pois sabia que me iriam desgastar, apenas mantive-me como me sentia confortável, talvez eles se tivessem a poupar para mais tarde.

Do Rossio vamos diretamente para a Praça do Comércio e, desta vez, em vez de virarmos à direita para a Rua do Arsenal e passarmos ao lado da Câmara de Lisboa, as obras obrigaram a seguirmos pelo caminho mais junto ao rio. Assim que viramos sente-se o vento, de repente toda a gente converge para o centro da estrada, a tentar apanhar o mínimo de vento possível, a “esconder-se” atrás do atleta da frente. O primeiro km já tinha passado, num tempo de 3’15’’.

Enquanto todos se tentavam manter atrás do atleta que tinham à frente, eu fui tentando passar alguns, sentia que o ritmo que tinha sido imposto naquela altura era demasiado lento para aquilo que eu queria fazer. Cometi o erro que tentar correr mais depressa, tentar apanhar um pequeno grupo de atletas que entretanto se tinha afastado. De forma a apanhar aquele grupo tive de correr até ao 3ºkm sempre com vento. Assim que os apanhei tinha em mente abrandar e recuperar um pouco (se é que se pode dizer que se pode recuperar a correr a 3’30’’/km).

Não faltou muito para me aperceber da dimensão do meu erro. Comecei a sentir dificuldade em mexer os braços, parecia que o sangue não afluía à extremidade das mãos. As pernas foram a seguir, sentia que os músculos não queriam mexer por mais que eu tentasse. Sentia os braços presos, talvez por estar a correr com uma camisola de manga curta em vez de alças, que não tem nada a "agarrar" o braço. No primeiro abastecimento foi quando fui forçado a abrandar. Olhei para o relógio e reparei que estava a correr a 3’45’’/km, senti-me desolado. Queria vir aqui para bater o meu recorde e estava a correr a ritmos que nem umas semanas antes na Meia Maratona tinha feito.

A volta estava nos 5km. Ainda foi uma distância que fiz em esforço, tentando não abrandar demasiado, mas a sentir que não estava a aguentar. Comecei a sentir o pior quando surgiu uma dor nas costas, talvez por estar a tentar repirar demasiado fundo para recuperar. Nesta altura fui passado pela primeira mulher. Ainda tentei aproveitar o grupo que seguia com ela, que tapava o vento, mas o cansaço era de tal ordem que nem assim conseguia correr.

Quando virei a favor do vento consegui ganhar um pouco de ritmo, mas ainda com bastantes dores. A única diferença aqui era observar que a maior parte dos atletas que segui à minha volta já não estava a fugir de mim, estava a conseguir manter o mesmo ritmo que eles. Assim fui andando até passar de novo pelo abastecimento, desta vez colocado ao início do 7ºkm.

Abrandei um pouco para beber água e refrescar a cabeça e senti um pequeno grupo a aproximar-se por trás de mim. Sem virar a cabeça para trás percebi que se tratava do grupo que acompanhava a segunda mulher. Uma força de motivação cresceu em mim neste momento, afinal poderia não estar assim tão mal. Comecei a acelerar, de repente já estava outra vez a baixar os 3’30’’ e a passar os altetas que me tinham passado nos últimos km’s.

Sabia o que ainda tinha pela frente, estava na zona de Santos, ainda tinha a reta até chegar ao Cais do Sodré e daí ainda seria 1km até à meta. Foquei-me apenas no infinito, não pensava na distância nem nos altetas que estava a passar, apenas em olhar em frente e controlar a respiração. Quando cheguei ao Cais do Sodré comecei a sentir algum cansaço, quase que a impossibilitar manter aquele ritmo até ao fim.

Pela primeira vez durante esta prova, colei-me a um atleta e prometi a mim mesmo que não o largaria até ao fim, ele seria a minha marca a atingir. Ainda me consegui colocar ao lado dele, mas o cansaço começava a sentir-se cada vez mais.

Estava agora de volta à Praça do Comércio. Tinha apenas de entrar na Rua da Áurea e dar a volta para passar pelo Arco da Rua Augusta. Um relance no relógio e vi os números 34:10. Será que ainda consigo chegar antes dos 35min?

Uma força surgiu em mim e, parecendo sem respirar, comecei a alargar mais a passada e a correr cada vez mais rápido. A passar debaixo do Arco senti uma sensação de vómito, estava no limite! Consegui chegar à meta com o tempo de 34:52. E como “quando a cabeça não tem juizo, o corpo é que paga”, quando parei cheguei mesmo a vomitar o resto de massa do pequeno almoço que ainda me restava no estômago.


Uma prova que continuo a considerar uma das minhas de eleição, melhorei a minha marca em cerca de 10 segundos. Não ponho em causa que seja uma marca bastante boa, apesar de tudo não é qualquer pessoa que faz os 10km em 35min, mas não me sinto realizado por isso, sabendo que se tivesse gerido, mesmo num dia de vento como o que estava, poderia facilmente ter feito 34min.

O meu registo do relógio aponta para 9,89km em 34min54seg. Um ritmo médio de 3’31’’/km (entretanto alterado para 10,0km, que indica uma média de 3’29’’/km).

Quilómetros:
1ºkm 3’16’’
2ºkm 3’21’’
3ºkm 3’26’’
4ºkm 3’38’’
5ºkm 3’48’’
6ºkm 3’46’’
7ºkm 3’40’’
8ºkm 3’35’’
9ºkm 3’27’’
890 metros 2’55’’ (ritmo 3’19’’)

Ver registo: Garmin Connect

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Meia Maratona Rock and Roll 2016


Foi para isto que treinei durante durante 7 meses: correr uma Meia Maratona em 1h16, média de 3’36’’/km. Pelo menos, era o que eu queria.

Depois de uma tarde de sábado a relembrar os campos de férias, com miúdos e monitores, sem a habitual corrida tranquila no dia anterior da prova, estava um pouco receoso com o que poderia ser a minha prestação. Acordei às 7h, ainda tinha de cozer massa, os hidratos bem necessários antes de uma prova longa.

Entre comer e preparar-me com tudo o que precisava, acabei por me atrasar um pouco. Tinha o problema de esta prova não ter bengaleiro, portanto não seria capaz de levar mochila com muda de roupa e, mais importante, telemóvel. Sabia que, enquanto atleta inscrito na prova, o dorsal me daria acesso aos transportes sem pagar, portanto a única coisa que levei foi uma nota dentro do dorsal, agarrada pelos pinos, caso fosse precisar de alguma coisa. Com o atraso de sair de casa fui a correr o meu máximo até ao comboio, mas não foi suficiente, cheguei à estação com o comboio a ir embora, tinha agora de esperar mais 20min pelo seguinte.

Entre o tempo de espera e a viagem de comboio foi uma hora até chegar a Lisboa. Não havia nada que pudesse fazer a não ser tentar relaxar, tentar não ficar nervoso e recuperar da dificuldade respiratória que se instalou depois do ritmo elevado a tentar chegar à estação rápido, sem aquecer. Pelo menos no comboio ainda consegui dormir uns 10min, sentia o cansaço, sentia cabeça pesada e uma ligeira dor de cabeça atrás dos olhos.

Quando cheguei a Lisboa ainda tive de ir para o metro. Num passo de corrida acelerado, não fosse um metro sair e ainda ter de esperar mais tempo. Ainda apanhei um outro corredor, meti conversa com ele, era um Alemão em Erasmus na faculdade de arquitetura. A viagem de metro passou mais rápido com a conversa, é sempre interessante descobrir pessoas novas, com experiências diferentes.

Chegados ao Parque das Nações a pior notícia abalou-nos: não havia mais autocarros para levar os atletas para a partida. Eram 9h35, a prova só começaria às 10h30 e a organização decidiu que não seriam necessários mais autocarros uma hora antes da prova. Sem mais nenhuma solução, fui a correr no sentido contrário da prova, até à partida. No local onde me encontrava, com mais cerca de 100 atletas, havia uma placa a indicar os 5km, portanto não teria grande problema a fazer essa distância no sentido contrário até ao local da partida. No entanto, nem isso foi permitido, pois a cerca de 2km de chegarmos, a polícia não nos permitiu prosseguir. Uma vez que os autocarros não nos levaram para a partida, seria de esperar que ao menos deixassem passar quem lá chega pelos próprios meios.

Sem mais nenhuma hipótese, ali fiquei, com o alemão e mais uns atletas. Esperamos pela partida e que os atletas da frente passassem por nós. Dei uns segundos de espaço para que os da frente ganhassem alguma distância, de forma a tentar simular o meu tempo se tivesse partido no início.

Tentei gerir o esforço desde o início, estava a tentar fazer algo que não sabia o que era nem como era, correr 21km (ou, neste caso, 19) a um ritmo de inferior a 3’40’’. A última vez que tentei fazer isto, em Setembro de 2014, comecei a ritmos demasiado rápidos e acabei por pagar forte por isso.

O primeiro quilómetro apitou no relógio: 3 minutos e 36 segundos. Perfeito, assim vou bem. Alguns atletas ainda continuavam a passar por mim, mas rapidamente ficou bem definido o ritmo e a posição de cada um.

As sensações eram novas e estranhas, já há bastante tempo que não fazia mais que uma série de 5 minutos a ritmos de 3’30’’. Os quilómetros foram passando, rapidamente saí da zona do Parque das Nações e ia em direção a Santa Apolónia. As obras complicaram um pouco o percurso, obrigando numa zona a fazer um desvio para uma rua secundária com uma pequena subida, mas inclinada. E como tudo o que sobe tem de descer, voltamos ao percurso normal passado 400 metros, era mesmo um desvio chato provocado pelas muitas obras na cidade de Lisboa.

Os apitos no relógio iam marcando o tempo de corrida, mas mais rápido do que talvez deveria, estava a fazer quilómetros a 3’30’’, vários seguidos. Como não sentia muito esforço fui mantendo, mas sempre receoso com o que poderia fazer mais tarde.

A água era bastante, a cada 3 quilómetros, nesse aspeto não tenho qualquer reclamação, especialmente num dia bastante quente. Os bombeiros também ajudavam, com mangueiras para refrescar. Em cada abastecimento, mesmo sendo bastante frequentes, bebi sempre um pouco de água e aproveitava também para deitar pela cabeça abaixo, mesmo sabendo que a roupa molhada pesava mais e limitava um pouco os movimentos.

A chegar a Santa Apolónia há uma grande subida, feita unicamente com o propósito de permitir aos carros passarem de um lado para o outro da linha de comboio. No entanto, acessos laterais permitem evitar essa subida. Já o tinha feito quando corri esta Meia Maratona e também quando fiz a Maratona. Mas desta vez não o fizeram, obrigavam a subir, que cortava completamente o ritmo e fazia subir o esforço. Nesse momento, para correr a um ritmo de 4’10’’ atingi o pico máximo de 195 batimentos cardíacos.

Depois de voltar a descer, estava a passar Santa Apolónia, onde sabia que não faltaria muito para chegar ao ponto de retorno. Nesse local, onde a prova ia já com 12km, cumpri os 10km com um tempo de 35:47, sentia-me bastante satisfeito comigo mesmo e dava-me motivação para o que ainda faltava.

O ponto de retorno era o local onde a Meia e a Maratona, que vinha já desde Cascais, se juntavam. Era também onde se encontrava o abastecimento que tinha gel energético. Um fator bastante mau era o facto de estar tudo junto, pelo que tinha acabado de pegar num gel e sem ter tido tempo para o tomar, já estava com uma garrafa na mão, ainda por cima aberta. Tentei rasgar o gel com os dentes, mas o buraco ficou tão pequeno que tinha de fazer força para que saisse alguma coisa. Mesmo tentando tapar o melhor que conseguia, a água estava a “fugir”, pelo que deitei o gel fora, bebi o resto da água e continuei a correr.

Depois do retorno tudo ficou mais complicado, o vento tinha vindo a ajudar e agora estava de frente. Fui tentando correr o máximo de tempo atrás de cada atleta da Maratona, mas estavam demasiado lentos e tinha sempre de andar de um lado para o outro. De tal maneira o vento estava mal que foi nesta altura que fiz o quilómetro mais lento da minha corrida: 3min44seg. Queria andar mais rápido que aquilo, mas o corpo já não permitia mais.

Começava a sentir a cabeça pesada, os sangue afluía as pernas e ja tudo me doía, até os braços tinham dificuldade em manter o ritmo normal. Foram vários quilómetros seguidos a ritmos de 3’40’’. Quando voltei a entrar no Parque das Nações o vento ficou ainda pior, afunilava pelos edifícios.

Nesse momento apanhei um atleta da Meia Maratona, um que me lembrava ter passado por mim no início. Tentei encostar-me a ele, eventualmente até passa-lo. Uma pequna subida fe-lo ganhar alguma distância e nunca mais consegui recuperar. Estava no final, faltavam 1200 metros para acabar. No entanto, o saber que estava a chegar deu-me alguma força para puxar um pouco mais e ainda consegui fazer o último quilómetro em 3min30seg. Era uma reta que passava em frente à Estação de Comboios, com muita gente a apoiar dos lados, a aplaudir e a puxar por nós. Sentia-me cansado, já não conseguia mais, queria parar.

Uma pequena descida e estava a 200 metros da meta, um corredor de patrocínios com o relógio a contar ao fundo. O cansaço era tal que já nem os olhos conseguia mater abertos direito. Vi o tempo a passar de 1h15 para 1h16, passei a meta 10 segundos depois. Mais uma vez, considero que este tempo seja bastante preciso com aquilo que faria, uma vez que apenas comecei a correr depois dos atletas da frente terem passado por mim e ainda ter dado cerca de 10 segundos antes de começar.

Sinto-me satisfeito pela minha prestação, os treinos deram o seu fruto, o qual agradeço à minha treinadora Sofia e a todo o pessoal do projeto Run2Improve e Run4Excellence.


É certo que não cumpri uma Meia Maratona em 1h16, a falha por parte da organização impediu-me. No entanto, o relógio contou o meu tempo e distância percorrida, naquilo que me foi permitido fazer. Foram 19km em 1h08, a um ritmo médio de 3’37’’/km.

Tempo final 1hora8min58seg, numa distância de 19,07km.
Quilómetros:
1ºkm 3’37’’
2ºkm 3’34’’
3ºkm 3’33’’
4ºkm 3’32’’
5ºkm 3’34’’
6ºkm 3’37’’
7ºkm 3’34’’
8ºkm 3’34’’
9ºkm 3’36’’
10ºkm 3’41’’
11ºkm 3’36’’
12ºkm 3’40’’
13ºkm 3’38’’
14ºkm 3’42’’
15ºkm 3’40’’
16ºkm 3’41’’
17ºkm 3’44’’
18ºkm 3’42’’
19ºkm 3’30’’
70 metros 13seg (média: 3’15’’)

Registo: Garmin Connect 

sexta-feira, 2 de setembro de 2016

Caminho de Santiago 2016 - Caldas de Reis a Santiago de Compostela

Acordei, olhei para o relógio: são 5h. Bolas! Devo ter desligado o despertador das 4h a dormir.
Rapidamente arrumo as coisas todas e vou para a entrada do albergue, ainda tenho de tratar dos meus pés. Com gaze gentilmente oferecida por outro peregrino, comecei por envolver o mindinho direito, estava menos mal que o esquerdo e queria ver como me sentia. Com um penso a servir como fita cola a fixar a gaze no sítio, calcei a primeira meia devagar e tento a certeza que não mexia muito a gaze. Ainda não tinha decidido se levaria outra vez duas meias, mas neste momento decidi que sim, precisava do conforto extra nos dedos.
No pé esquerdo foi mais complexo, o mindinho tinha duas bolhas diferentes e os dois dedos seguinte também cada um com a sua. Comecei por envolver o mindinho com uma "dose dupla", para ficar mais acolchoado. Depois, enquanto passava para os dedos seguintes, observei que não poderia colocar no diretamente a seguir, uma vez que já tinha o dobro da quantidade de um lado. Portanto, apenas coloquei no dedo do meio (que no pé não é o maior xD).
O teste demonstrou a funcionalidade do que estava a fazer, se conseguiria andar. Com uns primeiros passos feitos a custo, não demorou muito a conseguir andar bem. Já eram 5h40 e queria ter saído uma hora antes, tinha de me por ao caminho.
Com o primeiro quilómetro ainda de teste e também com algum cuidado relativamente ao caminho a seguir no escuro, a partir do momento em que saí da cidade e comecei a andar em estradas de terra, com os braços ainda a puxar bastante, fui sendo capaz de progredir a bom ritmo.
Com algumas subidas pelo caminho, parei ao fim de 5km para comer qualquer coisa, a partir dali só queria parar em Padrón.
Os primeiros passos depois de parado foram mais difíceis, tinha de me voltar a habituar as dores para conseguir andar. Ainda estava de noite e seguia sozinho, a neblina ainda pairava a minha frente, iluminada pelos postes de rua.
Enquanto que até aí tinha seguido com lanterna sempre na mão, nesta altura deixei-a guardada na bolsa lateral da mochila e apenas retirava quando, em algum cruzamento, precisava de verificar para onde apontavam as setas. Embora ainda escuro, o caminho não era muito técnico e, assim, permitia-me levar os dois batons nas mãos para auxiliar a progressão.
Sabia que tinha 12km até Padrón, que contava fazer em duas horas e descansar um pouco. Com o sol a aparecer atrás das montanhas lá fui seguindo. As mãos começavam a ficar cansadas de agarrar os batons com força, mesmo variando maneiras de pegar e de fazer força.
Cheguei a Padrón começando a reconhecer o percurso efetuado no ano anterior. Ia observando os marcos do Caminho, que indicam a distância restante até Santiago, e sabia que chegaria a Padrón quando faltassem 23.
Assim que cheguei fui para o café onde, o ano passado, paramos diretamente antes de sair de Padrón, onde o dono, Pepe, nos recebeu muito bem. Com um sumo de laranja e uma lata de atum para comer, em pouco tempo estava a seguir caminho, apesar de querer fazer o resto da distância em 4 horas, sabia que tal poderia não acontecer. À saída, tal como no ano passado, Pepe deu um abraço de boa sorte e palavras de incentivo.
Tinha pela frente uma etapa igual à de ontem, que me separou de Caldas de Reis, 23km de percurso mais de estrada, segundo me lembrava do ano passado.
Com os primeiros passos a muito custo depois de ter estado parado, comecei a ganhar ritmo e a fazer distância, percorrendo uma vez mais os caminhos que tinha feito da última vez com amigos do Caminho.
Fiz duas horas seguidas de caminhada e quando comecei a ficar com fome parei no café onde tinha comido uma "empanada" (nosso empadão) que tinha adorado. Era a meio caminho entre Padrón e Santiago, altura ideal para parar e depois fazer seguido até lá. Uma fatia quentinha no momento e outra guardada para levar.
Uma vez mais, bastaram os 10min que estive parado para custar a andar a seguir. Mas desta vez não iria parar até chegar ao meu destino, cada paragem custava mais a arrancar de novo. 12km, duas horas para chegar ao meu destino e acabar esta aventura.
Passado pouco tempo, ainda com pouco mais de hora para chegar, comecei a sentir uma outra coisa a chatear, a sentir eventualmente uma nova bolha a formar-se. Desta vez no próprio pé, esquerdo e bem junto aos dedos. Ainda ontem comentava que as minhas únicas bolhas seriam nos dedos, que os meus pés estavam impecáveis, mas agora estava a observar-se que não era o caso.
A habituação às outras bolhas manteve-se da mesma maneira, especialmente com o acolchoamento da gaze, mas esta nova não me permitia habituar, era nova e incomodava cada vez mais, doía a andar. Além da bolha, comecei a sentir as pernas cansadas e a custarem a mexer, os mais de 200km estavam a começar a pesar bastante.
Para piorar a situação, já a menos de uma hora do destino, sem querer comecei a seguir um caminho alternativo, que por vezes leva por sítios mais "tradicionais", mas que também aumenta a distância. Honestamente, neste momento não queria nada disso, só queria chegar. Apercebi-me disso enquanto ia andando e nada do que via era minimamente semelhante com o que me lembrava do ano passado, tinha algum receio de me ter enganado, mas marcos semelhantes aos anteriores iam indicando a distância. A única diferença era que estes marcos de pedra não indicavam a distância, tinham uma seta amarela e eram garantidamente muito mais novos que os outros.
Quando voltei a entrar em percurso que conhecia ainda pensei que tivessem alterado parte do mesmo por algum motivo. Mais em baixo, antes de começar a subir bem e entrar na cidade, reparei numa bifurcação as setas amarelas pintadas a mandar pelo lado que tinha já feito o ano passado é um desses marcos a mandar para outro. Como não queria andar ainda mais, fiz o que já conhecia e que seria mais direto.
Depois de subir durante mais de um quilómetro seguido, estava a entrar em Santiago. À entrada faz lembrar Valença, que para chegar ao destino tem de se subir uma avenida, mas esta era maior, tinha de continuar a subir ainda mais. Para piorar, havia ainda menos setas a indicar o caminho, daquilo que se vai vendo na parte espanhola do Caminho. Portanto, com alguma insegurança se estaria a ir corretamente, lá fui subindo até que cheguei a uma passadeira de que me recordava. Passando essa passadeira, apenas virar à esquerda e já se via a catedral ao fundo, surgir por cima dos edifícios.
Com a rua cheia e movimentada devido às várias lojas, fui andando devagar e cheguei finalmente à Catedral. Cheguei finalmente ao meu destino, ao fim de cinco dias de caminhada e algum sofrimento!

Não tinha muito tempo, eram 14h e queria voltar para o Porto às 17h.
Encaminhei-me diretamente para o local onde levantaria a Compostela, mas não estava lá nada. Perguntei a uma pessoa onde poderia levantar e indicou-me que tinha mudado de sítio, para perto da praça principal à frente da catedral. Pelo caminho perguntei mais 3 vezes, sempre a achar um pouco estranho o local para onde me mandavam. As instalações novas pretendiam ser melhores e mais rápidas a atender, num edifício que parecia ser um convento.
Demorei uma hora a receber a Compostela, já eram quase 15h30.
Com bastante sofrimento dos pés depois de ter estado parado na fila, fui para a praça tirar umas fotos com a catedral nas costas, merecia uma "selfie" depois de todo este sofrimento.

A mancar um pouco, encaminhei-me para o terminal de autocarros para voltar para o Porto. Fecho o dia de hoje enquanto estou no autocarro de volta para o Porto.

A etapa de hoje de 43km foi feita em 7 horas de caminhada, para o qual tive de fazer mais de 55 mil passos e queimar 4500 kcal. Foi a conclusão do Caminho, a conclusão de uma aventura que me propus fazer, de um desafio que estabeleci pessoalmente.

quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Caminho de Santiago 2016 - Mós a Caldas de Reis

4o dia, já só falta hoje e amanhã, a maior parte já ficou para trás.
Hoje foi o dia mais difícil, é o acumular de tudo até agora.
O levantar da cama custa sempre, com o corpo já todo massacrado, uma ligeira dor de costas, os dois tornozelos a doer um pouco e os dedos do pé esquerdo com algumas bolhas. É difícil resistir à tentação da cama, mas o desafio espera-me, tenho de continuar.
À saída do albergue, com uma barra de cereais na mão para dar a dose de açúcar matinal, comecei logo a subir e assim se manteve durante uns 3 quilómetros. Com o pé com duas meias e as sapatilhas de trail, esperava que talvez os pés aguentassem melhor o dia.
No plano conseguia andar a bom ritmo, mesmo com o pé esquerdo magoado, ia compensando com os braços, mas nas descidas tudo mudava. Para além da bolha no mindinho, comecei a sentir um grande desconforto nos dedos do meio do pé, que não percebi bem se seria bolha ou não. Ocasionalmente parava um pouco para ajeitar o pé e ver se estava tudo bem, mas o desconforto e a dor continuou. Para piorar, tudo o que subi ontem e hoje ao sair do albergue, desci no espaço de dois quilómetros antes de chegar a Redondela. Portanto, descidas bem acentuadas e que nunca mais acabavam, a ter de parar a cada dois minutos para ajeitar o pé e com os batons a tentar amortecer a maior parte do impacto.
Assim que cheguei a zona plana, com recurso aos braços para auxiliar, impus um ritmo mais elevado que mantive até entrar na cidade de Redondela. Aí, parei para comer algo mais substancial e descansar um pouco as bolhas, apenas 1h30 depois de ter começado.
Não quis estar a tirar a sapatilha para avaliar, não iria adiantar nada olhar e o tirar a pressão poderia implicar a dilatação das bolhas e do pé e não conseguir voltar a calçar depois. É serrar os dentes e continuar, já falta pouco!
Assim que recomecei tentei andar rápido, a distância hoje ainda seria muita e não tinha muito tempo a perder. Passei outra vez pelos portugueses de ontem, que tinham ficado em Redondela. Umas pequena troca de palavras, algumas de ânimo, e segui caminho.
A maior subida apareceu logo depois. Mesmo esperando e sabendo o que seria, continua a ser algo bastante difícil. Tentei fazê-la o mais rápido possível, a utilizar a beira da estrada onde os pés e os batons conseguiriam ter melhor tração. Culpa minha por querer ser rápido, estava distraído e acabei por me perder, subindo demasiado. Na volta para trás consegui perder-me outra vez, nem repetir o caminho no inverso consigo fazer direito. Apesar de pagar por isso, fui forçado a ligar os dados móveis e abrir o GoogleMaps, de maneira a perceber o que tinha feito mal e voltar ao caminho correto.
Assim que o encontrei, impus um ritmo forte, estava chateado por me ter perdido e ter feito mais 2km desnecessariamente. Os pés já não me doíam, as bolhas já não incomodavam, apenas queria andar e recuperar o tempo perdido.
Enquanto ia andando mais uma coisa aconteceu para me chatear ainda mais: comecei a sentir uma dor no pé direito. Mas não era dor de bolha, parecia que a unha de um dedo estava agarrada à meia, dando sensação de a unha estar a ser arrancada. Sentei-me, tirei as meias (visto que tenho duas calçadas em cada pé xD), ajeitei as de dentro em contacto com o pé e segui caminho. Durante as descidas os dois pés chateavam-me, mas no plano e nas subidas conseguia andar a bom ritmo, sempre com os braços a puxar bem.
O caminho passava pela floresta, com algumas subidas mais complicadas, onde passava por mais gente um pouco mais lenta. Não tinha a certeza quanto teria de fazer até ter visto o sinal da distância que faltaria até Pontevedra, seriam 30 no total até lá mais 23 até Caldas de Reis, o dia de hoje foi puxado mas deixa menos para fazer amanhã.
À saída da parte de montanha tenho uma escolha a fazer: faço a parte final até Pontevedra pela estrada ou a acompanhar um riacho, pelo meio de uma floresta? Por um lado, a beleza da floresta é incrível, mas já o conhecia do ano passado e pela estrada seria mais rápido, apesar de mais entediante. Escolhi a estrada, quero fazer o Caminho, mas já tenho bastantes quilómetros para fazer em cada dia e não me quero demorar demasiado.
Assim que cheguei a Pontevedra o albergue ainda estava fechado, tinha pensado lá ficar um pouco a descansar na entrada. Fui para um café ao lado comer qualquer coisa e descansar sentado. Acabei por ficar mais tempo que inicialmente previsto, mas acabei por me por ao caminho, com energia para a distância que me separaria de Caldas de areia e do descanso de hoje.
A energia estava lá, mas desapareceu tão rápido que fiquei parvo. Assim que coloquei os pés no chão, depois de terem estado pendurados a descansar de um banco alto, as dores foram terríveis, nem conseguia andar direito. Os primeiros 3 quilómetros foram penosos e lentos, a sentir o pé direito ensopado, alguma bolha tinha rebentado. Foi o tempo de sair de Pontevedra e começar a estrada de montanha, altura em que me habituei a dor e com grande auxilio dos braços com os batons consegui ir andando.
Ao fim de 10km, com partes a subir a montanha, parei no café onde no ano passado tinha tomado pequeno almoço com o Rui, Dan e a Marta. Estava igual, com a mesma senhora a servir. Bebi um sumo de laranja, comi umas barras das minhas e com alguma conversa com os senhores que lá estavam segui caminho, ainda faltavam 12km e a vontade seria ficar ali se me deixasse descansar demasiado tempo.
Os braços já estavam cansados do esforço, as mãos já não conseguiam agarrar com tanta força as pegas e ia tentando variantes de modo de segurar. Sabia que ia demorar, sentia os quilómetros a passarem muito penosamente, apenas pensava na dor que tinha no pé esquerdo e a sentir a bolha no mindinho do pé direito.
Neste momento tomei a decisão de que não valia a pena pensar nisso, ontem também tinha sofrido no final até Mós, mas já fazia parte do passado. Portanto, deixei de olhar para a distância no relógio, nem quando apitava a cada quilómetro, deixei de olhar para os marcos do caminho, aqueles que indicam a distância que falta até Santiago, e, acima de tudo, pus-me a andar decidido, a bom ritmo e com os braços a impor a velocidade. Quanto mais rápido andar, mais passadas vou dar, menos tempo de contacto com o solo tenho, menos tempo a fazer pressão nas bolhas, menos dor. Além disso, já me tinha habituado a dor e já não sentia, era sempre a andar para a frente e nem para tirar fotografias parava, já não conseguia pensar nisso.
Assim que cheguei a Caldas de Reis encaminhei-me diretamente para o albergue, só queria sentar-me e tirar as sapatilhas. Foi preciso passar quase até à saída (é uma cidade bastante pequena) para chegar ao albergue oficial, para descobrir que já estava cheio e tinha de voltar tudo para trás para o opcional, já em grande sofrimento depois de pensar que já tinha chegado.
O momento de tirar as sapatilhas foi quase assustador. Comecei pelo pé direito, tirei uma meia de cada vez e verifiquei que tinha uma pequena quantidade de sangue na unha onde tinha sentido a chatear. Ficou o pior para depois, enquanto tirava lentamente as meias, com algum receio de ficarem coladas a alguma coisa. O mindinho, tal como ontem, tinha uma bolha, mas o pior eram os dois dedos seguintes: colados um ao outro e com restos do que foi uma bolha de sangue e que tinha rebentado.
No banho tudo melhorou, as peles soltas saíram e limpou o sangue todo. Na lavagem da roupa reparei na quantidade de sangue que saiu das meias do pé esquerdo, ao menos tinham feito o seu trabalho que absorver qualquer "humidade", deixando o pé seco.
Descobri que não só sou mortal como tenho um limite bem definido.

O dia de hoje contou com cerca de 52km a andar, a contar com os dois em que tive perdido, num total de quase 9 horas. 60 mil passos e 5 mil kcal foi o necessário para completar a etapa de hoje.

Amanhã serão 43 até Santiago, passando por Padrón aos 18km. Conto acordar às 4h, para ter tempo de lá chegar, a contar com eventualidades dos dedos e das bolhas, e ter tempo de ir buscar a Compostela antes de ir tentar apanhar a camioneta para o Porto.

Está quase!

quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Caminhos de Santiago 2016 - Rubiães a Mós

O despertador tocou as 5h, não queria acreditar que já estava na hora. Desapertei o saco cama mas deixei-me ficar ali na preguiça uns minutos, sentia-me demasiado exausto para continuar.
O arrumar das coisas demora sempre algum tempo e, sendo o único acordado, tentei fazer devagar e com o mínimo de barulho possível. Parece que quanto mais devagar se faz uma coisa, mais barulho ela fará.
O relógio marcava 5h30 quando comecei a andar. Ainda de noite e com segmentos sem qualquer tipo de iluminação a não ser a minha lanterna, os primeiros 4 quilómetros demoraram mais do que queria a serem feitos. Após isso e com apenas 45min de caminhada, parei um pouco para comer alguma coisa. Embora ainda fechado por ser muito cedo, parei no mesmo café onde, no ano passado, o meu pai decidiu que não conseguiria continuar devido as bolhas nos pés.
Quando recomecei a andar impus o ritmo elevado a que me habituei nos últimos dois dias, que me permite cobrir boa distância sem chegar demasiado tarde aos locais. Em apenas 1h já tinha entrado no concelho de Valença e 30min depois, com 17km realizados, já estava no forte, à saída de Valença, à saída de Portugal.
Faltava agora a primeira etapa que no ano passado realizei sem o meu pai, 23km até Mós. Começando por atravessar a ponte que liga Valença a Tui, para entrar oficialmente em Espanha e nos últimos 115km até Santiago.
À saída de Tui uma parte muito chata: mais de 4 quilómetros seguidos em estrada nacional. Embora permita andar a bom ritmo por ser plano o suficiente, a monotonia da estrada cansa muito mais que qualquer montanha. Além do cansaço psicológico, a estrada também já me estava a dar bastantes dores nas plantas dos pés, pelo que aproveitava sempre que a terra na beira da estrada era grande o suficiente para lá andar, sendo muito mais suave o impacto nos pés.
A estrada da lugar a montanha e, passado bastante tempo, cheguei a uma espécie de café, nas traseiras de uma casa, onde já tinha parado o ano passado. Desta vez estava vazio, para quem teria saído de Valença já era bastante tarde. No entanto, apanhei o primeiro grupo de portugueses do Caminho desde que comecei; eram 4 em que um tinha cometido o mesmo erro que eu na primeira vez, enquanto inexperiente: trazer a mochila demasiado carregada. 
A paragem foi curta, dando apenas para uma bebida fresca. Assim que continuei tinha em mente que, daí a pouco, chegaria ao local onde há uma pequena "guerra" entre comerciantes e a Associação do Caminho de Santiago da Galiza, em que uns querem mudar parte do Caminho para uma parte mais bonita pela floresta, e os outros insistem em fazer de tudo para que os peregrinos se mantenham no percurso antigo. No local onde se dá a alteração de percurso observa-se várias tentativas de quem defende o novo percurso a serem destruídas e substituídas por outras. Muitas manchas de tinta preta a tapar as setas amarelas "verdadeiras" e muitas outras setas, também amarelas, a tentar encaminhar para a zona industrial, onde os comerciantes acreditam que conseguirão vender se as pessoas por lá passarem.
A parte da floresta era exatamente como me lembrava: de uma beleza incrível e intocada a não ser o simples caminho que lá passa no meio. Uma pequena ponte de pedra para passar por cima do riacho e uma outra a acompanha-lo onde não há caminho.
Assim que saí deste percurso de floresta encontrei um casal a falar com uma pessoa de mota, eram uns alemães a quem um espanhol, membro da Associação, explicava o novo caminho, fora do complexo industrial. Este espanhol tinha já passado na zona perto de Porriño a renovar as setas amarelas e ia a caminho da primeira zona de "guerra" para também lá renovar. A estas pessoas tenho imenso a agradecer pelo seu esforço em manter o Caminho algo apreciável de se realizar.
Continuando o meu caminho, a sentir-me cada vez mais cansado e com os pés a ressentirem-se, fiz o esforço de chegar até Porriño. Lá, sentei-me 5min a descansar os pés, passei num supermercado a comprar cereais e barras de cereais e em pouco tempo segui caminho, faltavam apenas 6km para o Albergue e poder descansar a vontade, apenas 1h de caminhada.
Não demorou muito para ter a certeza de uma coisa: tinha uma bolha. Afinal sou mortal! Ontem fui sentindo uma coisa estranha no pé esquerdo, debaixo dos dois dedos mais pequeno, aquilo que parecia ser uma bola, ou a meia estivesse dobrada. Mas sempre que parava e mexia um pouco o pé a verificar, não parecia ter nada. Decidi não mexer, tentar ignorar a dor e continuar a andar, fazendo mais força com os braços de forma a aliviar ainda mais a pressão das pernas e utilizando os batons para me ajudar a andar ainda mais rápido, estava determinado a chegar ao albergue. Mesmo assim, estranhamente, apareceram-me dores nas pernas, estavam a começar a queixar-se da pancada que apanharam ao longo de 3 dias, mesmo com a quantidade de proteína que tenho comido, entre as barras e as latas de atum. Entre as pernas cansadas e a começarem a doer e a planta dos pés também dorida, só aliviava e distraia esta dor o sentir a bolha a crescer.
O reconhecimento do local do albergue foi uma grande alegria, só queria tirar a mochila e descansar. O tirar das sapatilhas confirmou o receio de ter uma bolha, no mindinho do pé esquerdo. Além disso, observando ao espelho, que também já tinha reparado ontem, tinha umas pequenas bolhas e micro espinhas nos ombros. A minha teoria é que o estar tanto tempo com a mochila nos ombros impediu a pele de respirar corretamente, provocando pequenas espinhas. Fora isso, sinto-me bem, para alguém que acabou de fazer 150km em 3 dias haha.

A etapa de hoje demorou mais de 7h a ser cumprida, percorrendo uma distância de mais de 42km. Mais de 50 mil passos e 4500 kcal foram necessários para isso.

terça-feira, 30 de agosto de 2016

Caminho de Santiago 2016 - Barcelos a Rubiães

Segundo dia, o relógio está no pulso e apita: são 5h, é hora de levantar. Arrumo as coisas rapidamente, deixando os calções ainda molhados pendurados de fora da mochila. Passado meia hora já estou a andar, a sair de Barcelos. 20 segundos depois de começar já estava a voltar para trás, tinha-me esquecido dos batons na entrada do albergue xD.
Os primeiros quilómetros foram lentos, especialmente por ser de noite e ter de parar várias vezes para ter a certeza que estava no caminho certo. As subidas começaram a aparecer e uma ligeira dor na planta do pé esquerdo foi surgindo, uma dor de pressão, mas que não impede de continuar.
Com a acumulação das subidas e tendo apenas comido uma barra de proteína antes de sair, ao fim de apenas 1h30 parei para descansar e comer. Uma lata de atum, uma barra de cereais, uma vista de olhos nas redes sociais e estou pronto a seguir. Tal como ontem, aproveitando também para escrever um pouco.
Tendo já experiência do percurso do ano passado, sabia que ainda faltavam mais de 24km até chegar a Ponte de Lima. Como daí seriam mais 17 até Rubiaes, decidi fazer tudo seguido. Foram 4 horas a andar a ritmos elevados, de forma a ganhar algum tempo que usei depois para descansar. Os batons sempre a ajudar no ritmo e a reduzir a pressão nas pernas. No entanto,  cada vez mais fui sentindo e foi crescendo uma dor na planta dos pés, estar tanto tempo de pé começava a custar.
Sabia que queria fazer direto até Ponto de Lima, para depois descansar um pouco e fazer de seguida o resto até Rubiães. A parte que mais custou foram os últimos 10km, já tinha 20 nas pernas e começava a sentir-me cansado. Um pé à frente do outro, com algum esforço lá cheguei a Ponte de Lima, onde fui em direção ao albergue. Uma vez que ainda eram 12h e o albergue apenas abriria as 16h, estava vazia a entrada. Sentei-me num banco a sombra a descansar e comer um pouco, até que me encostei a mochila e adormeci para uma pequena sesta.
Assim que acordei e preparei-me para sair, apesar de ainda ser cedo, faltavam 17km a percorrer pela montanha. Com os pés descansados e com energia renovada, os primeiros quilómetros foram feitos rapidamente, sabendo também que perderia algum tempo nas subidas. A meio caminho parei 5min para atestar a água e carimbar a credencial e lá segui para as subidas.
Pelo caminho passei por um casal Canadiano, tendo seguido um pouco com eles na conversa. Tinham já realizado o Caminho Francês no espaço de 6 anos: a cada ano voltavam para o sítio onde tinham ficado no ano anterior, totalizando os 1500km num maior espaço de tempo.
Estando a contar com 17km desde Ponte de Lima, tinha ideia que a distância do dia seriam 50 certos e fui com isso em mente, a contar quanto faltaria até ao albergue. No entanto, depois de descer do topo da Serra da Labruja, o albergue não apareceu na altura devida. Apesar de ser apenas 1km depois, quando se faz uma distância destas e se espera a certa altura a chegada, cada 100 metros a mais custam muito mais psicologicamente.
Mas finalmente tinha o meu descanso, pude tirar as sapatilhas dos pés e a tshirt encharcada em suor. Tomar um banho quente para relaxar e lavar a roupa do dia.
Jantei cedo, no restaurante perto do albergue, e antes das 19h30 estava pronto a voltar, arrumar tudo e ir dormir.

Os 51km de hoje foram realizados em 8h45, para o qual foram necessárias 5 mil kcal. 60 mil passos requeridos para o dia de hoje, os meus pés merecem descanso.